"Não devemos permitir que uma só criança fique em sua situação atual sem desenvolvê-la até onde seu funcionamento nos permite descobrir que é capaz de chegar. Os cromossomos não têm a última palavra". (Reuven Feuerstein)

terça-feira, 10 de março de 2015

Autismo: o que mostra um grande estudo de gêmeos


O autismo é uma doença neurológica complexa que se caracteriza pelo comprometimento na linguagem – atraso do início da fala, comunicação, interação social e estereotipia ou movimentos motores repetitivos, como agitar as mãos – e que tem sido objeto de muitas pesquisas. No início acreditava-se que tinha causas ambientais. Culpavam a mãe por não saber estimular suficientemente ou rejeitar os filhos (classificadas em inglês como “refrigerator mothers”). Um estudo publicado em 1988 na Inglaterra associou a aplicação de vacinas com o desenvolvimento do autismo. Recentemente foi demonstrado que a pesquisa era uma fraude, mas que teve um impacto negativo gigantesco porque muitos pais deixaram de vacinar seus filhos com medo que pudessem desenvolver autismo.

Hoje sabe-se que há um componente genético importante e acredita-se que há vários genes que interagindo com o ambiente podem levar ao desenvolvimento do autismo. Mas a grande questão é saber quais são esses genes e qual é a importância do ambiente no desenvolvimento do autismo? Para tentar tirar isso a limpo um grupo de pesquisadores americanos acaba de publicar um trabalho na revista Archives of General Psychiatry comparando a incidência de autismo em gêmeos idênticos e gêmeos fraternos. Para falar mais sobre isso entrevistei a Dra. Maria Rita Passos-Bueno, que desenvolve uma pesquisa importante no Centro do genoma Humano em genética de autismo.

Segundo a pesquisa realizada, que acaba de ser publicada, os autores concluem que embora a parte genética tenha um papel importante, o ambiente teria mais peso no desenvolvimento da doença. Você pode explicar como foi feito esse estudo?

A comparação da coincidência (ou concordância) do autismo nos pares de gêmeos idênticos (ou monozigóticos) em relação a coincidência do autismo nos pares de gêmeos fraternos (também chamados de dizigóticos) pode nos dar uma pista sobre a relevância dos fatores genéticos e ambientais na expressão da doença. Este estudo publicado na revista Archives of General Psychiatry fez exatamente isto. Os autores mostraram que o componente genético explica aproximadamente 40% da doença enquanto que 60% da expressão da doença depende de fatores ambientais.

Este trabalho difere dos anteriores pelo critério rigoroso quanto a classificação clínica do autismo e o número maior de pacientes analisados (192 pares de gêmeos) de forma que os dados podem ser mais representativos. De qualquer forma, o principal recado deste artigo, é que não só fatores genéticos, mas também fatores ambientais contribuem para a expressão do autismo.

Os pesquisadores que buscam a etiologia do autismo precisam ter isso sempre em mente. É importante ressaltarmos aqui que quando falamos de fatores ambientais, que ainda são pouco conhecidos, não estamos voltando a culpar a mãe. Poderia ser, por exemplo, uma deficiência de oxigenação na hora do parto ou algum outro fator durante a gestação. Os fatores ambientais são fisiológicos e não emocionais.

A pesquisa que você está realizando no CEGH aponta para um mesmo resultado?

A pesquisa na área de genética de autismo que desenvolvemos no CEGH não deve ser comparada diretamente com este estudo epidemiológico, pois estamos estudando pacientes que já têm alguma alteração cromossômica, mesma que pequena, para entender melhor o autismo principalmente na sua parte genética.

Você acredita que a partir desses estudos será possível encontrar um tratamento para o autismo?

Acreditamos, sim, que entender melhor a causa do autismo abre perspectivas de tratamento, pois permitirá identificar drogas que possam amenizar o efeito da alteração genética responsável pelo autismo naquele determinado caso. Um dos fatores importantes para o sucesso destas intervenções será certamente o tratamento precoce e, consequentemente, estes pacientes precisam ser diagnosticados o quanto antes. O diagnóstico precoce é ainda um problema importante no nosso meio, apesar de que há alguns grupos, como o liderado pelo Dr. Estevão Vadaz, do Hospital das Clínicas, em São Paulo.
Um outro aspecto importante, é que parece haver um grande número de possíveis causas para o autismo, de forma que entendendo um caso, não sabemos quanto poderemos ajudar os outros. Ao desvendar os aspectos genéticos do autismo, no entanto, poderemos contribuir não só na busca de tratamento como também na realização de diagnóstico mais precoce com maior precisão.

Fonte: http://veja.abril.com.br/blog/genetica/sem-categoria/autismo-o-que-mostra-um-grande-estudo-de-gemeos/

Autismo é quase inteiramente ‘causado pela genética’, aponta estudo

Pesquisa realizada com 516 gêmeos apontou que constituição biológica é responsável por entre 74 e 98% dos casos
POR O GLOBO COM SITES INTERNACIONAIS
05/03/2015 8:44 / ATUALIZADO 05/03/2015 9:37

Pesquisadores avaliaram gêmeos criados na mesma casa, pelos mesmos pais - Reprodução/Freeimages
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RIO - Uma nova pesquisa realizada pelo Conselho de Pesquisa Médica do Reino Unido sugeriu que o autismo é quase inteiramente de origem genética, com a constituição biológica sendo responsável por entre 74% e 98% dos casos. O estudo se concentrou em um total de 516 gêmeos e descobriu que as taxas de Transtorno do Espectro Autista (TEA) foram maiores em gêmeos idênticos que compartilham o mesmo DNA, apontando, portanto, que a condição pode ser mais hereditária do que se pensava.

Publicado na revista “JAMA Psychiatry”, o levantamento também mostrou que genes foram responsáveis ​​por traços autistas e comportamentos da população em geral.
“Nossa principal descoberta foi a de que a hereditariedade do TEA foi alta. Esses resultados demonstram ainda a importância dos efeitos genéticos sobre a doença, apesar do aumento dramático na prevalência da doença nos últimos 20 anos”, observa a autora principal do estudo, Beata Tick, Instituto de Psiquiatria do Conselho .
A partir da análise de dados da base populacional do Estudo de Desenvolvimento de Gêmeos (Teds, na sigla em inglês), que abrange gêmeos criados na mesma casa, pelos mesmos pais, os pesquisadores avaliaram, no entanto, que não era possível excluir completamente a influência de fatores ambientais.
Já o professor e coautor do estudo, Patrick Bolton explicou que a comparação de gêmeos idênticos e não-idênticos é uma forma bem estabelecida de esclarecer o grau de influências genéticas e ambientais no autismo, principalmente com o aspecto inovador desse levantamento que foi a inclusão de gêmeos independentemente de terem tido um diagnóstico clínico.
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“Isso nos permitiu obter uma imagem mais precisa de como as experiências ambientais de uma criança e sua composição genética são influentes no TEA, bem como em expressões mais sutis de habilidades e comportamentos autistas”, explicou.
A pesquisadora Francesca Happe afirmou, ainda, que as taxas mais elevadas de autismo nos últimos anos poderiam ser atribuídas a diagnósticos mais corretos. A desordem, um espectro de condições que varia muito de pessoa para pessoa, pode ter sido previamente classificada como uma dificuldade de aprendizagem, e não reconhecida como autismo, informou à “BBC”.
“Nossos resultados sugerem que fatores ambientais são menores, o que é importante, uma vez que alguns pais estão preocupados se fatores como alta poluição possa estar causando o autismo”, disse ela. “Algumas pessoas acham que pode haver um componente ambiental grande, porque o autismo tem se tornado mais comum nos últimos anos, mas o que aconteceu muito rápido para a genética para ser uma causa provável.”