Dependência dos pais
No dia em que Hyandra, a
caçula da família, completou 9 anos, os pais, Kelly e Silvio, prepararam a casa
para a festa.
O entra e sai de pessoas
perturba o irmão mais velho de Hyandra. Idryss, de 15 anos, tem uma forma grave
de autismo.
Idryss não fala. Com
frequência, morde a mão e a gola da camiseta, comportamento repetitivo que
piora quando ele fica nervoso. Mudanças na rotina podem ser desagradáveis para
pessoas com autismo. Por mais que o pai tente, Idryss não se acalma. O menino
exige atenção constante.
Nos primeiros meses de vida,
o desenvolvimento de Idryss foi igual ao dos outros bebês. O drama da família
também atinge a filha mais nova. Hyandra não tem autismo, mas sofre com a falta
de atenção dos pais.
Algumas manifestações do
autismo exigem tanta atenção que levam a família ao desespero. Todos passam a
viver em função da criança, em tempo integral. Família nenhuma está preparada
para enfrentar um problema dessa gravidade sem receber orientação
especializada.
No terceiro episódio da
série, o Doutor Drauzio Varella fala dos principais métodos de tratamento do
autismo. E como é possível tornar o mundo mais acessível a eles.
O autismo modificou
radicalmente a rotina da família de Kevin. Reginaldo, o pai, chegou a
trocar de emprego para ficar mais tempo perto do filho.
Ele comprou um carro e
começou a fazer anúncios pelas ruas do bairro. A mãe, Vera, vai o tempo todo
atrás, tomando conta do menino.
Os pais não veem outra
solução a não ser satisfazer as vontades de Kevin. É o que acontece também
quando eles permitem que o menino tome banho toda hora. Será que essa é a
melhor maneira de lidar com os comportamentos repetitivos, comuns no
autismo?
“Quando eu percebo que,
quando eu me bato, me mordo, bato a cabeça na parede, pai e mãe imediatamente
deixam de fazer o que fazem para me socorrer, eu tenho a chave para ele, eu
estou dizendo: ‘quando você quiser minha atenção, basta se machucar’. E, como
qualquer um de nós, você também repetiria incessantemente a mesma coisa que te
traz uma recompensa. Estar abraçado ou contido pelos pais pode ser uma
recompensa e eu acredito que ele esteja fazendo isso a todo momento”, explica o
doutor Salomão Schwartzman.
Como a família do Kevin, os
pais de Idryss mudaram de vida em função do filho. Eles passaram a trabalhar em
casa. Kelly instalou uma máquina de costura em um canto da sala. Ela faz
toalhas de mesa que o marido, Sílvio, vende.
Idryss não desgruda do pai.
Cuidar de uma criança com autismo pode ser uma carga imensa. Em certos casos, o
transtorno impõe tantas limitações que um simples passeio no parque se mostra
impraticável. Esse dia a dia às vezes se torna sufocante.
“Você já passa a tomar
atitudes superprotetoras, você começa a, sem querer, entrar na doença do filho.
Eu diria que algumas famílias com filhos com autismo ou alguma outra condição
crônica, acabam também se tornando autistas, porque passam a viver em função
daquela condição e não aprendem a forma correta de você tentar evitar os
comportamentos inadequados, inserir essa criança no mundo, na medida do
possível”, avalia Schwartzman.
Como as alterações que levam
ao autismo ainda são mal conhecidas e o transtorno é incurável, existe um
número muito grande de tratamentos que prometem bons resultados. Muitas dessas
terapias não têm comprovação científica.
Glúten
Crianças com autismo às
vezes são extremamente seletivas para se alimentar. Chegam a limitar o cardápio
a apenas um tipo de comida. É mais uma atitude que a terapia comportamental
tenta desestimular. Muitas famílias acreditam que cortar o glúten da dieta dos
filhos alivia os sintomas do transtorno. Glúten é a proteína encontrada em
cereais como trigo, cevada, centeio e aveia.
Na casa do Renato, sempre há
duas opções de refeição. Ele e os dois filhos com autismo não comem nada com
glúten.
Os especialistas argumentam
que não há comprovação científica de que o glúten tenha influência nos quadros
de autismo.
Tratamentos
Em São Paulo, a AMA,
Associação de Amigos do Autista, oferece tratamento gratuito, em convênio com o
governo estadual, para pessoas com o transtorno.
Na AMA, as crianças realizam
uma lista de atividades organizadas em painéis. É o método "TEACCH".
O objetivo é dar um mínimo de independência, ensinando as tarefas simples do
dia a dia.
Os alunos aprendem a arrumar
a cama, escovar os dentes, amarrar os sapatos. A cada acerto, a criança pode
fazer algo que goste.
Os pais de Idryss contam que
ele melhorou bastante com a terapia comportamental.
Outro exemplo de aprendizado
que ajuda a melhorar a comunicação é o método PECS. As crianças juntam
cartões para formar frases.
Lucas é uma das crianças
atendidas pela AMA. Ele tem um tipo mais brando de autismo, diferente dos casos
de Kevin e Idryss. Até recentemente, essa forma do transtorno era conhecida
como síndrome de Asperger.
Os portadores de Asperger
não apresentam deficiências intelectuais graves. Eles são capazes de se
expressar, muitas vezes com uma linguagem formal, rebuscada, e geralmente têm
um talento direcionado para uma área específica.
Este ano, os médicos
abandonaram essa denominação. Agora, a síndrome de Asperger é considerada
apenas mais uma manifestação do espectro do autismo.
Depois de receber o
diagnóstico de autismo, a família levou Kevin para a AMA. Kevin passou por uma
avaliação. Apesar do diagnóstico tardio, a terapia comportamental ainda pode
ajudar o menino.
Mas, infelizmente, Kevin vai
ter que esperar. A AMA está sobrecarregada. As oportunidades de tratamento
gratuito não estão ao alcance da maioria das famílias Brasil afora.
“É um dos principais
problemas de saúde pública da infância. Se você imaginar que 1% da população
tem isto, você necessita de uma estrutura extremamente complexa e abrangente. E
escute, eu tô falando de São Paulo, Drauzio. Você sai daqui e vai aí para Norte
e Nordeste, você não encontra nada em algumas cidades”, destaca Schwartzman.
É obrigação do Estado
atender às pessoas com autismo. Desde 2012, uma lei determina que o transtorno
receba o mesmo atendimento destinado a outros tipos de deficiência mental.
As famílias que têm crianças
com autismo devem procurar os CAPS, Centros de Atenção Psicossocial. Mas eles
não estão presentes em grande parte dos municípios brasileiros.
Lucas
E aí a pergunta é: faz o diagnóstico,
levanta uma ansiedade brutal, e você não tem como atender essas pessoas? Nesses
casos, o desenvolvimento das crianças depende exclusivamente da dedicação das
famílias. Dedicação como a de Paula, mãe de Lucas, que criou uma cartilha para
que ele se acostume com o que vai encontrar fora de casa.
Lucas já aprendeu a andar
sozinho na rua. Ele entendeu que não pode atravessar a rua quando o sinal
estiver aberto para os carros. Mesmo com a rua livre, Lucas espera
pacientemente.
Agora, a mãe, Paula, está
ensinando o filho a andar de ônibus sozinho e a manter a calma quando ela não
está por perto. Paula mostra pontos de referência para que Lucas não perca o
ponto de parada.
Ele aprendeu no computador e
nas viagens com a mãe quais são os pontos de referência que deve observar.
Vinte minutos depois, chega ao ponto final. E os pais esperam por ele.
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